Segunda-feira, 29 Abril 2024

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Três desejos para o génio da lâmpada

opiniãoAndré AraújoTrês desejos para o génio da lâmpada

Nestes tempos perigosos que vivemos, muito se escreve e muito se diz. E, sentado a pensar no que poderia acrescentar, pensei reflectir sobre os desafios que temos, enquanto povo, confrontados com este infeliz limbo de, das duas, uma: ou o que suspeita o Ministério Público confirma-se e adensa-se a ideia de que temos, nos sucessivos governos, uma captura dos benefícios dos grupos económicos contra o interesse colectivo ou as suspeitas não se confirmam e houve uma acção não suficientemente fundamentada pelo MP e PGR, com um impacto político aterrador. Já que nenhuma das hipóteses é benigna para a Democracia, proponho pensar em três ideias para o futuro. Assim, se por acaso, encontrar um génio numa lâmpada que queira comigo discutir a vida política nacional e as próximas eleições legislativas, acreditem que provavelmente não vão andar longe dos seguintes: 

1. Que não se ceda na chantagem do “voto pela estabilidade”. Este quase ano e meio de maioria absoluta do PS deve servir para tirarmos ilações sobre a estabilidade tanto política como de governação. No plano das opções políticas, as escolhas foram contrárias aos problemas das pessoas, como se sente pelo aumento da justa contestação que, em todos os quadrantes da vida social e profissional, leva milhares às ruas. Por outro lado, no plano da governação propriamente dita, todos estamos recordados do descalabro que se lamentavelmente viveu. Em nome da estabilidade, aqueles que hoje dizem que os parlamentos não devem cair, em 2021 suplicaram pela sua dissolução (com a ajuda do Presidente da República), pasme-se, por uma tentativa falhada de passar um Orçamento do Estado. Contudo, os portugueses têm boa memória, e também se lembram que o Governo com menos casos, com mais medidas sentidas pelos portugueses e que, apesar de todas as insuficiências, trouxe evoluções para o progresso do país foi o período entre 2015 e 2019, a dita “geringonça” onde o PS foi obrigado ao diálogo à sua esquerda.

2. Que não esteja no centro do debate político a ideia de uma inevitabilidade do crescimento da extrema-direita, ou que o voto no PS é a única alternativa para o impedir. Entendo a tentação de quem já o esboçou, naturalmente às portas de uma campanha eleitoral em posição profundamente frágil. Sugiro o olhar para França, pois pode bem ser um exemplo de que essa estratégia da “falsa dicotomia” com a extrema-direita mais não faz do que a reforçar. 

3. Que não se caia na ilusão que discutir a vida política nacional ou discutir as próximas eleições legislativas é falar de casos judiciais, falar de corrupção ou – muito menos – estar de calculadora a pensar no suposto inevitável crescimento de forças retrogradas, racistas ou até de cariz fascizante. Nada mais errado. O verdadeiro assunto em política é e será sempre os problemas das pessoas e as respostas para as suas resoluções. O verdadeiro assunto é, entre outros, o aumento do custo de vida, a crise na habitação, a defesa do SNS e da Escola Pública. O que deve ser avaliado pelos portugueses é a resposta que cada partido dá aos verdadeiros problemas. Esta longa campanha eleitoral será exigente para os partidos democráticos, pois se for feita apenas na base desta suspeita, com um ambiente muito propício ao populismo, não vamos ter nem uma campanha esclarecedora, nem um bom resultado para a democracia portuguesa. 

São três singelos desejos de quem pede não para si, mas para o país e para o debate democrático que o seu povo merece. Pelas horas de comentário político que nos entra pela televisão adentro, temo que estes meus três desejos não se vão cumprir. Todavia, cabe-nos a nós democratas – “rua a rua”, “conversa a conversa” e “café a café” – procurar fazer destes desejos uma realidade.

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