Sexta-feira, 4 Outubro 2024

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O dragão das botas. Cansadas

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Não que a liga portuguesa esteja atribuída – até ao lavar dos cestos da matemática ainda é vindima e Sérgio Conceição destaca isso mesmo: de acordo com a filosofia do clube, o FC Porto só cairá mesmo quando a ditadura dos números assim o obrigar. Seja como for, a leitura da realidade é claramente outra: só um cataclismo (leia-se incompetência em grande escala) impedirá o Benfica de conquistar a liga portuguesa, isto mesmo contando com um calendário de Liga dos Campeões que motivará um desgaste ainda maior nos quadros da águia. A probabilidade, por ínfima que seja, ainda existe no plano teórico. Mas, na prática, a coisa é diferente. O Benfica só não será campeão se não quiser. Literalmente. 

Cataclismo ou intempérie. Tudo na mesma altura. Não que o FC Porto esteja em crise nem para lá caminhe. A questão é que as lesões vieram na pior altura e afetaram um leque significativo de elementos determinantes – Otávio, Galeno, Evanilson, Pepe e João Mário – numa fase decisiva da temporada, o que provocou um conjunto de problemas diretos e indiretos. Em primeiro lugar, pela lógica da própria ausência de tais elementos e pela consequência de Sérgio Conceição estar num estado de ginástica tática permanente; depois, porque não jogando uns, outros têm de jogar mais minutos do que aquilo que seria suposto, o que origina um desgaste e uma deturpação do plano previsto para esta altura da caminhada. Remendo em cima de remendo não é o mesmo que bordado imaculado. Não há milagres. 

É claro que há um elemento que ajuda na maquilhagem do período que se atravessa: a obtenção do golo. Ou seja, por muito que o fluxo de dinâmica ofensiva possa e deva de ser melhorado, certo é que se impunha um maior pragmatismo na altura de finalização, situação que poderá estar relacionada com o consequente desgaste (falta de discernimento/frieza) da equipa. Em Braga, mesmo ao cair do pano, aquela situação de Evanilson tem mesmo de ser golo. É também claro que podemos rebobinar e argumentar com a falta de criatividade do plantel portista. Para além do valor individual de Fábio Vieira, Vitinha e Francisco Conceição, há um denominador comum que une os três elementos: a tal criatividade. Ou seja, o cenário é completamente diferente do que aquele que se pintaria caso se tivesse vendido um central, um médio e um avançado: é um tiro num atributo comum, sendo que todas as soluções representam uma situação de improviso e nunca a melhor solução, sendo que a tal melhor solução implicaria um investimento avultado num só quadro – o médio-criativo anda caro. Não está em saldos. 

No jogo de Braga, o cansaço de Galeno, Uribe e Taremi foi notório e ressalvou-se nos detalhes. Receção “menos” orientada do que o costume; perceção mais lenta do que aquela que era pretendida; e, finalmente, alguma incapacidade para contrariar os pontos fortes de um Braga que não fez por menos. Aliás, não fosse Sérgio Conceição ter mexido na equipa ainda na primeira parte e puxado Uribe para a posição de pivô defensivo, e o problema podia ter-se agudizado. E é um facto: com as atuais condições, Sérgio Conceição faz o que pode, mesmo trabalhando em cenário de improviso constante: algo que não ajuda a um pensamento de consolidação e estabilidade que deve caracterizar uma equipa grande. 

Com a cortina da temporada a não estar fechada, o melhor que se tem a fazer é mesmo perspetivar os próximos tempos. E nunca num cenário catastrofista: por muito que não ganhar a liga seja sempre um fracasso para os lados do dragão, certo é que um eventual 2º lugar acrescentado de conquistas da Taça de Portugal, Supertaça e Taça da Liga e ainda os oitavos de final da Liga dos Campeões são um desiderato razoável tendo em conta um contexto inicial atribulado. Mas tudo desagua num novo planeamento da próxima temporada: fazer de tudo para se precaverem saídas inesperadas, blindando o plantel dos ditames do mercado e sempre com a premissa de que o desenvolvimento harmonioso do plantel é a principal ferramenta que um clube português pode ter para ser competitivo a nível nacional e internacional. 

E há uma questão adicional: o FC Porto poderia ou não ter feito investimentos mais racionais? Não ter investido tanto em David Carmo, Verón, Grujic ou Eustáquio? O argumento é legítimo mas a resposta pode estar na própria estratégia de longo-prazo: Sérgio Conceição é exímio na potenciação dos seus jogadores em contexto de treino, sendo que Luis Diaz e Pavia não se fizeram numa só temporada. A possível conclusão de que um jogador triunfou ou fracassou é apenas mensurável mediante um determinado intervalo de tempo. Seja como for, ainda há aquela fatia reservada para os “Uribe” de serviço. Para os “Marchesin”. Aqueles que não pedem licença. Chegam, veem e vencem. Uma fatia cara, é certo, mas já diz a espuma dos dias. O caro sai barato e o barato sai caro. 

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