Zé Pedro Ferreira: Para começar, o Spiridon recebeu há dias o reconhecimento do Clube Top do IPDJ. O que é que isto significa para um clube?
Tiago Faria: Receber esta menção honrosa do IPDJ, no programa Clube Top, que visa premiar os clubes com melhor gestão desportiva, é para nós sinónimo de orgulho, mas também de responsabilidade. Quero dizer também que já é a segunda vez que recebemos. O ano passado o prémio foi referente à criação da nossa equipa de benjamins, que apelidamos de Spiridon Kids, que por curiosidade, foi o nome escolhido pelo próprio plantel. E este ano, foi referente ao projeto que fizemos no ano letivo passado, que foi o atletismo na escola. Nós tivemos uma parceria com algumas escolas, mais especificamente como o Agrupamento Diogo de Macedo, em que fomos à totalidade das escolas primárias, e demos a oportunidade de terem uma aula experimental de atletismo, para todos os alunos, de todas essas escolas. Portanto, mediante alguns critérios de avaliação definidos pelo IPDJ, tivemos direito a uma menção honrosa e assim, ser premiados.
ZPF: Parecendo que não, estamos a falar de muito trabalho, com certeza para pouca gente. Atletismo é correr, mas o atletismo não é, propriamente, chega lá e corre. É preciso alguma preparação por trás?
TF: O atletismo, antes de mais, não é só correr, como já foi dito. É correr, saltar, lançar e marchar, com a marcha atlética. É, enfim, todo o trabalho desde a própria realização desse exercício. Correr exige muito treino específico, de reforço muscular, de resistência, de velocidade e de flexibilidade. Assim como dos lançamentos aos saltos, e na marcha, todos têm as suas especificidades, mas também têm algo em comum, promovendo um trabalho multidisciplinar.
Em termos do projeto em si, sim, o associativismo é algo que é sempre um trabalho inacabado e é sempre por um conjunto um pouco poucas pessoas. Como é óbvio, é mediante os tempos livres e trabalho voluntário de cada um, não é trabalho profissional. Mas com esforço e, sobretudo, com ambição, conseguimos chegar onde queremos, seja mais depressa ou mais devagar.
ZPF: O atletismo acaba por, de certa forma, estar na moda. Digo de certa forma, porque acaba por ser um bocado a moda da corrida de caminhada. Isto veio relançar, de uma forma mais popular, outra vez a modalidade. Ao mesmo tempo, o Spiridon além de ir às escolas, tem tido o cuidado de tentar envolver a comunidade numa série de iniciativas. Ainda há pouco tempo, por exemplo, fez um dia de treino aberto no recinto da Feira dos Carvalhos. Para vocês, o segredo para o futuro é mesmo este envolvimento de toda a gente, para tentar chamar cada vez mais gente?
TF: Sim. Mas respondendo aqui partes, primeiro, o que está na moda é o trainning, que é, portanto, correr sem parar. Aí sim, de forma não estruturada. Nós fazemos o atletismo como um todo. Ou seja, como já disse, as várias disciplinas e de forma estruturada, com o devido acompanhamento dos nossos técnicos em determinadas especialidades. Felizmente, começamos a ver mais gente a correr na rua, o que é sinónimo que existe quem procure praticar atividade física. No entanto, ainda não é suficiente para os padrões que se pretende. E nós enquanto clube, obviamente, também focamos um bocadinho a parte competitiva, os resultados e, mais importante que isso é ter impacto na sociedade que nos rodeia. Este é também um fator integrativo. E o desporto é um dos maiores meios de integração para as pessoas, em especial para os mais novos. Como também são a promoção de hábitos de vida mais saudáveis e a ocupação de tempos livres.
ZPF: Falando na população aqui à volta, nós encontramo-nos a gravar esta entrevista no Estádio Jorge Sampaio. E um dos problemas que vocês têm é precisamente o estado da pista. Numa entrevista, há dias, com o Presidente da Câmara de Gaia, ele falava que dificilmente vai conseguir fazer obras nesta pista, a curto prazo, por estar a reestruturar a da Lavandeira e o dinheiro não chegar para tudo. No entanto, para vocês, a Lavandeira acaba por ser muito longe, uma vez que a maior parte, sobretudo dos miúdos, são aqui da beira. Estou correto
TF: Correto. Nós por acaso treinamos aqui e estamos sediados aqui em Pedroso. De certa forma, nós vamos buscar, entre aspas, os atletas que são mais do sul de Gaia, ou em freguesias mais deslocadas para o interior. Portanto, nós acabamos por fazer um bocadinho de desporto de forma descentralizada, e é essencial continuar poder a praticar aqui a nossa modalidade, para dar oportunidade a todos, mais jovens ou menos jovens, das várias freguesias, de ter um local que seja mais próximo do seu local de residência, para poder treinar. A Lavandeira compreendo que é um sítio mais central e com melhores acessos, possivelmente. No entanto, ao deslocarmos para a Lavandeira, não só é um local que já está lotado, como também estaremos a tirar a possibilidade das pessoas que vivem mais perto da fronteira com o distrito de Aveiro.
ZPF: Qualquer pessoa que venha aqui ao estádio percebe o estado da pista, em termos de alguns buracos e sítios onde acumula muita água. Isso dificulta apenas o treino ou estão, neste momento, a colocar de certa forma em risco a integridade física de alguns atletas.
TF: Primeiramente, nós sempre tivemos um bocadinho dificuldades com algumas disciplinas mais técnicas na área dos lançamentos, mais especificamente os lançamentos mais longos, como é o caso do disco, do martelo e do dardo. O disco ainda podemos improvisar um bocadinho nas pistas, mas o dardo tem que ser lançado para a relva e o martelo, é um engenho que é muito pesado, com atletas a lançar um engenho de 5 ou 6 kg, a grande velocidade e distância. Como isso poderá criar algum problema no relvado, não podemos lançar para lá e temos que ter um bocadinho de improviso, no que toca a treinar os lançamentos. Este tartan ainda é o primeiro e com o passar dos anos, onde salvo erro, o estádio foi inaugurado em 2003 ou 2003, obviamente a pista tem exatamente essa idade. Com o passar dos anos, o desgaste e as condições climatéricas, cada vez mais adversas, é normal que a pista comece a apresentar algumas falhas. Inicialmente era algo que era um pouco incómodo, desconfortável, mas que dava para contornar o problema. Nós também já estamos habituados e, apesar de tudo, somos até um bocadinho privilegiados, porque nem todos os clubes de atletismo têm direito a uma pista, e nós temos. Nesse aspecto, também temos que agradecer a oportunidade da Câmara de podermos deixar de treinar aqui. No entanto, tem causado bastante preocupação porque a pista está degradada e nos últimos meses têm-se notado de forma mais acentuada. Chegamos ao ponto não só das fissuras e rasgos, mas há zonas já em completo cimento, o que potencia lesões. Especialmente quando estamos a falar de utilizar sapatos de bicos, um material muito específico para o tartã. E chegamos a alguns pontos na pista em que já temos uns altos, quando diria de uma profundidade de mais ou menos 10 a 15 cm, onde facilmente alguém pode tropeçar. Em particular, esses autos encontram-se nos 3 primeiros corredores da pista, que são os corredores mais utilizados em todo em todo o estádio. Então, se falarmos em crianças que que usam e abusam entre aspas, a pista torna-se perigosa para haver alguma queda e, consequentemente, alguém se magoar.
ZPF: Neste momento o Spiridon tem quantos atletas, divididos por quantos escalões?
TF: A época passada, que terminou no início deste mês, conseguimos 75 atletas, de todas as idades. O mais novo com 5 anos e o mais velho, o mais clássico por assim dizer, com quase 60. Portanto, nós cobrimos todos os escalões e géneros.
ZPF: Falamos do estádio, com o bom e o mau, da vantagem de ter uma pista e a desvantagem de estar em mau estado. Mas, tirando isso, perguntava-lhe quais são, neste momento, as maiores carências do Spiridon, as maiores dificuldades que encontram no dia a dia?
TF: Falta ter um sítio seguro para treinar.
ZPF: Mas quando falamos de dificuldades, falamos também da parte financeira, que é sempre importante. Como estamos na relação com os patrocinadores, com os vários apoios necessários?
TF: Bom, dentro do possível, estamos bem. Não estamos ricos, muito pelo contrário, mas também não estamos agora aqui com défice nas contas. Mas a atividade anual que fazemos requer muito investimento, e cada vez mais. Por exemplo, as taxas de inscrição e os seguros desportivos têm vindo a aumentar cada vez mais. E anualmente existe um vasto conjunto de material que entra em desgaste, ou simplesmente estraga, que é preciso renovar. Portanto, se vamos fazer um orçamento do que é necessário por época, para continuar a ter o mesmo registo, estamos a falar de algumas centenas, ou mesmo, milhares de euros. É nesse sentido que nós procuramos patrocinadores e parcerias que nos possam auxiliar a continuar a ter este trabalho tão importante para nós e para quem faz parte do clube, para que se tenha as melhores condições possíveis. E consequentemente melhores resultados possíveis.
ZPF: A questão dos horários também está sempre dependente Futebol Clube do Porto?
TF: E também está dependente do voluntariado das pessoas, porque, apesar de tudo, a maior parte de nós tem ocupação profissional e só ao final da tarde é que poderá ser treinador ou vir treinar. Nós gostaríamos pelo menos de ter uma maior abertura por parte da sociedade, no geral. Acho que já se chegou a bom porto e o Spiridon já é reconhecido pelo menos a nível local. No entanto, nós reforçamos mais uma vez, e em particular até por termos sido recentemente premiados, à abertura por parte das escolas, para nós podermos continuar a expandir o projeto do atletismo nas escolas. Acho que é algo que prima pela sua inovação, prima pela sua irreverência e nada melhor do que mostrar a todos nós, que o sucesso escolar e atividades desportiva podem, e devem, estar em parceria.
ZPF: O atletismo, como qualquer desporto, é competitivo e toda a gente anda para ganhar. No entanto, nós vemos os vossos treinos e o ambiente é, sobretudo ao nível dos mais novos, muito salutar. Uma autêntica festa. Como é que se consegue esta interação de todos? Até porque são idades diferentes, feitios diferentes, vêm de escolas diferentes e, portanto, a maior parte é só daqui que se conhece.
TF: O Segredo é que a nossa prioridade é o bem-estar de todos e de todas. O nosso principal objetivo é que as pessoas saiam daqui mais formadas. Seja a conviver uns com os outros, seja também no conceito de cultura desportiva, o desporto como um todo. Mas também o que é atletismo, desmistificar o que se associa ao atletismo que é, lá está, o correr sem parar. Depois é muito carinho e dedicação. Sabemos que não é fácil, pessoas vêm meios diferentes, temos estados sociais diferentes, temos inclusive nacionalidades diferentes, e é tentar conciliar isso tudo com um propósito. Neste caso, como já dissemos, fazer atividade desportiva e é focar-nos na evolução física e até pessoal da pessoa e depois fazer a relativizar um bocadinho a parte competitiva, porque no atletismo é algo que demora. É um processo muito complexo, longo e que exige paciência. E se as pessoas forem devidamente regulares e dedicadas, estou certo de que alcançarão o sucesso ou os títulos que tanto desejam.
ZPF: Tiago, para terminar, um desafio, que é o de tentar convencer os leitores a vir experimentar o atletismo.
TF: Como eu já disse, o atletismo é para todos, independentemente da idade. Tenham 4 ou 60, como como já tive oportunidade de dizer, tenham 8 ou 80. Independentemente de cor, de correrem muito ou pouco, não gostarem de correr ou simplesmente se quiserem fazer exercicio físico de forma mais regular, mas com devido acompanhamento e, sobretudo, com um grupo de treino que se preocupa com o próximo e gosta de conviver, o Spiridon Gaia é o local ideal para isso. Pelo histórico que já tem e pelo que irá construir. Pensem num grupo de amigos em que o seu vício, entre aspas, é fazer exercício físico e em particular atletismo.