O memorando de entendimento assinado quarta-feira, dia 27, entre Federação Portuguesa de Futebol e a Liga Portuguesa de Futebol Profissional para centralização dos direitos televisivos é “uma excelente notícia”, disse hoje à Lusa o especialista em ‘marketing’ desportivo Daniel Sá.
“Acho que é uma excelente notícia. Vai maximizar as receitas de todos os clubes em Portugal, e estranho não ter vindo mais cedo, quando praticamente todas as grandes ligas do futebol europeu já o fizeram. (…) É uma medida que, presumo, pode ter sido acelerada com o contexto de crise. Era o único caminho que havia a ter pelo futebol português, e ter FPF e Liga juntas no memorando são excelentes notícias para todos”, explicou o docente universitário, diretor executivo do Instituto Português de Administração e Marketing (IPAM).
Daniel Sá considera que a efetivação da medida trará, com uma negociação coletiva, um valor “bastante superior aos contratos individuais”, garantindo “mais dinheiro para todos os clubes portugueses, e dinheiro melhor distribuído”.
Numa Liga “muito desequilibrada” do ponto de vista desportivo, este momento pode “proporcionar recursos financeiros mais próximos entre os clubes”, dando maior competitividade, em teoria, ao campeonato.
Ainda assim, e apesar de admitir que “por uma questão de economia de escala”, o consumidor também possa beneficiar, ao “pagar menos por cada jogo que vê”, dependendo “da negociação coletiva”, o especialista não avança um valor possível para o ‘bolo’ total.
“É difícil avançar com um valor neste momento, porque temos contratos desfasados no tempo, mais o caso inédito na Europa de o Benfica ter os próprios direitos. Do meu ponto de vista, faz com que seja muito difícil passar deste cenário atípico para o valor total. Mas no mínimo falaremos de uma maximização pelo menos de 50% face aos valores que existem”, avança.
Daniel Sá acredita ainda que apesar de o memorando falar de um horizonte temporal até 2028, quando encerram contratos individuais de vários clubes, possa “ocorrer mais cedo” um acordo entre as partes.
Para a negociação, “quanto mais cedo melhor”, uma vez que a crise trazida pela pandemia de covid-19 “obriga o futebol português a reinventar o modelo de receitas, e esta é uma parte central”.
Apesar de a venda ser centralizada, a negociação pode “envolver um, dois, três operadores, o que seja”. “E a nível geográfico, poderá haver uma negociação para Portugal e outra internacional”, acrescenta.
O especialista dá o exemplo da Liga inglesa, que “tem receitas internacionais muitíssimo superiores” ao contrato inglês, e mesmo que a Liga portuguesa “não tenha o mesmo apelo da ‘Premier League’, pode incrementar muito o mercado internacional”.
Ainda assim, alerta para as limitações do produto, que no mercado internacional compete com muitos outros campeonatos, usando “a lógica da venda de vinho no supermercado” para o explicar.
“Neste contrato, o pacote Liga está no supermercado internacional, ao lado da Bundesliga, da Premier League. Não faltam produtos. É como exportarmos o nosso vinho, nos Estados Unidos, e estamos numa prateleira com 10 metros com vinho de todo o lado. Para colocarmos a nossa embalagem nos supermercados internacionais, também temos de o promover, embalar, e tornar atrativo”, comenta.
Se nem “todos os jogos da Liga serão interessantes do ponto de vista mediático” no estrangeiro, poderá haver uma venda diferenciada, com alguns mercados, como os países dos PALOP ou de comunidades portuguesas muito fortes, com um pacote mais completo, e outros com a compra de “cerca de 10 jogos”, que envolvam os três ‘grandes’ e o Sporting de Braga, que habitualmente protagonizam os jogos mais decisivos ou antecipados.
“O mercado português vai ter de se posicionar. O que é que quer para o seu produto? Dificilmente nos vendemos como a melhor Liga do mundo. Temos de encontrar o posicionamento certo. Acho que este vai muito bater à perspetiva de termos muitos dos novos craques dos próximos anos, portugueses e estrangeiros”, propõe.
Daniel Sá usa ainda o exemplo de um confronto entre o PSV e o Ajax, habitualmente mais esperado a nível internacional no que toca à Liga holandesa. “Em vez de vendermos a palete toda, vendemos só duas caixas”, afirma, voltando à comparação com o vinho.
Certo é que será um “trabalho longo” num mercado “muito competitivo”, em que o futebol compete não só com outras modalidades como também com o mundo do entretenimento, com o consumidor a escolher em que aplicar o dinheiro no que toca a subscrições.
Outra estratégia que vê como exequível, no plano internacional, passa pelo que a Liga espanhola tem feito, por exemplo, “aproveitando as diferentes nacionalidades” das ‘estrelas’ de cada clube, como o chinês Wu Lei do Espanyol, que traz “audiências impressionantes” daquele país.
Assim, a ligação japonesa do Portimonense, com o Japão a colocar outros jogadores internacionais em clubes portugueses, do Santa Clara ao Gil Vicente, mas também “os mexicanos e colombianos do FC Porto” ou os vários jogadores iranianos no campeonato podem ser “um atrativo muito importante” para negócios com países mais periféricos.
A Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP) assinaram na terça-feira um memorando de entendimento para concretizarem a centralização dos direitos televisivos até 2027/28, anunciaram hoje os dois organismos.